DALILA
                  TELES VERAS é portuguesa,
                  nascida no Funchal, Ilha da Madeira (1946), residente no
                  Brasil desde 1957. Animadora cultural, organiza cursos, seminários
                  e congressos, participou de dezenas de concursos literários,
                  como organizadora e integrante do júri.
                  Participou
                  como convidada da UNESCO, do Colóquio Imprensa de Língua
                  Portuguesa no Mundo, realizado em junho de 1991, em Paris, com
                  a comunicação "A Imprensa Alternativa no Brasil como
                  resistência cultural".
                  Fundou
                  o Grupo Livrespaço de Poesia, que desenvolveu intensa
                  atividade cultural, de 1982 a 1993, publicando livros,
                  promovendo oficinas, recitais e semanas culturais. Foi uma das
                  editoras da revista literária, trimestral, LIVRESPAÇO, que
                  circulou nacional e internacionalmente de 1992 a 1994, e
                  ganhou o prêmio APCA (Associação Paulista dos Críticos de
                  Arte), 1993.
                  Coordenou
                  dezenas de oficinas, entre as quais, na Oficina da Palavra,
                  Casa Mário de Andrade, SP. Participou do Projeto "O
                  Escritor nas Bibliotecas" (1993/1994) da Secretaria
                  Municipal de Cultura de S.Paulo.
                  Diretora
                  e Secretária Geral da União Brasileira de Escritores (SP)
                  por três gestões — 1986/88, 1990/92 e 1994/96 — como
                  Secretária do Conselho daquela entidade. Eleita
                  "Intelectual do Ano", 1997, no Prêmio Capital,
                  instituído pelo Jornal cultural O Capital, de Aracaju – SE.
                  Desde
                  1992 é diretora-proprietária da Alpharrabio Livraria Espaço-Cultura,
                  em Santo André, onde promove constante atividade voltada para
                  a divulgação da cultura e das artes na região do Grande
                  ABC, além da criação das Edições Alpharrabio, Editora que
                  já publicou cerca de sessenta obras de autores regionais.
                  
                  LIVROS
                  PUBLICADOS 
                  
                  
                  Lições
                  de Tempo (1982 e 2ª edição 1983, SP); Inventário Precoce
                  (1983, SP); Madeira: do Vinho à Saudade (1989, Portugal e 2ª
                  edição, 1997, SP); Elemento em Fúria (1989, Teresina);
                  Forasteiros Registros Nordestinos, plaquete (1990, SP); A
                  Palavraparte, pequenas prosas em poemas, (1996, SP); À Janela
                  dos Dias - poesia quase toda (2002, SP) de poesia. A Vida Crônica
                  (1999, SP) e As Artes do Ofício – Um Olhar sobre o ABC,
                  ambos de crônicas; e Minudências, um diário literário do
                  ano de 1999. Selecionou e prefaciou O Mistério da Casa Velha,
                  contos, de Cora Coralina (Global Editora, SP – 1989).
                  
                  
                  
                  
                  
                  
                  
                  
PD
                  - Como está a cena poética de Santo André?
                  
                  
                  DTV
                  - A cena poética em Santo André vem mostrando uma inquestionável
                  vitalidade desde o início dos anos 80, com a formação do
                  Grupo Livrespaço e a publicação, em 92 e 93, da revista
                  literária homônima, acrescida, nos últimos cinco anos, de
                  jovens talentos, que vem sendo editados pela Alpharrabio
                  Livraria e Editora. Além da Livrespaço, outras importantes
                  revistas literárias, como Monturo, A Cigarra e a mais recente
                  delas, a Cacto, também saíram de Santo André, uma cidade
                  pertencente à região metropolitana que, infelizmente, por
                  desconhecimento, ainda é vista por grande parte do Brasil,
                  como "interior" de São Paulo ou, pior, apenas como
                  uma região de vida operária, por conta do pioneirismo da indústria
                  automobilística, que por aqui se instalou na década de 50.
                  Entretanto, na esteira das grandes conquistas sociais saídas
                  desta região, já podem ser registrados os avanços de uma
                  literatura aqui produzida, que se insere e dialoga com a boa
                  literatura nacional.
                  
                  
                  PD
                  - Por que o poeta atual gosta de sublinhar que não pertence a
                  nenhuma corrente literária?
                  
                  
                  DTV
                  - Eu diria que essa insubordinação refere-se muito mais à
                  rejeição de uma escola, grupo ou geração, do que
                  propriamente a uma determinada "corrente literária"
                  que, a meu ver, estaria representada numa afinação, inevitável
                  diálogo com o seu próprio tempo. Alguma coisa mágica e
                  planetária, que acaba por estabelecer um certo parentesco
                  entre aqueles que estão preocupados em construir uma obra
                  através da palavra escrita, seja lá qual for a língua em
                  que se expressem, representada por uma espécie de marca comum
                  do seu tempo, diferentemente da pasteurização que os
                  estabelecimentos e rigores canônicos de determinados
                  movimentos tentavam produzir como justificativas de
                  modernidade
                  
                  
                  PD
                  - Há epígrafes de Drummond e Cabral em seu livro. Qual influência
                  sofre destes poetas?
                  
                  
                  DTV
                  - Nenhuma ou as mesmas que sofri de todos os poetas com quem
                  experimentei o sentimento de impacto, do soco no estômago,
                  como Pessoa, Murilo, Bandeira, Jorge de Lima, Ferreira Gullar,
                  Adélia, Hilda Hilst, Mário Faustino, Camões, Raul Bopp,
                  Guimarães Rosa, Borges, só para citar aqueles que também
                  homenageio no livro, em forma de epígrafe. Vozes dissonantes
                  que antropofagicamente degluti, cânone pessoal, anárquico e
                  polifônico.
                  
                  
                  PD
                  - Qual a principal lição que o tempo dá para um poeta?
                  
                  
                  DTV
                  - A da humildade. A da capacidade de perceber que a vaidade
                  leva ao equívoco e à cegueira. A certeza de que nada se sabe
                  e os caminhos (o poeta andaluz já sabia disso) se fazem ao
                  andar.
                  
                  
                  PD
                  - O que é o haicai para Dalila Teles Veras?
                  
                  
                  DTV
                  - Uma forma epigramática de ver/olhar o mundo que representa
                  pouco no conjunto de minha obra. Fiz algumas experimentações
                  que denominei de "falsos haicais", justamente porque
                  me falta (e, acredito, que à maioria dos ocidentais) o senso
                  de contemplação e comunhão com a natureza, essenciais a
                  essa forma de expressão poética. A velocidade da vida atual
                  não é compatível com o haicai, apesar da aparência
                  enganadora dessa (rápida?) forma de poesia.
                  
                  
                  PD
                  - Por que reuniu a sua obra quase toda num livro?
                  
                  
                  DTV
                  - A idéia da publicação de uma antologia surgiu como forma
                  de comemorar os vinte anos da publicação do primeiro livro,
                  Lições de Tempo, resgatando poemas que foram publicados em
                  livros de tiragens reduzidas, além de boa parte de minha
                  produção poética que estava fora desses livros, espalhada
                  por jornais e revistas literárias. Porém, quando iniciei o
                  trabalho de seleção, dei-me conta de que o exercício destas
                  duas décadas operara transformações na forma do meu fazer
                  poético e não resisti à tentação de, ao invés de
                  simplesmente selecionar os poemas "preferidos",
                  reescrever os "preteridos", principalmente aqueles
                  dos primeiros três livros, mostrando, dessa forma, algumas
                  possibilidades dessas transformações, nas quais foram
                  experimentadas outras dicções de linguagem. No decorrer do
                  percurso da reescrita, comecei a desejar que o resultado dessa
                  reunião, não fosse o de uma antologia, mas de um livro
                  verdadeiramente novo, com uma certa unidade de linguagem e que
                  provocasse uma nova leitura. Tentei transformar esse conjunto
                  numa espécie de síntese daquilo que desejei dizer ao longo
                  dessas duas décadas de publicação literária. Espero que o
                  tenha conseguido. Tudo aquilo que ficou de fora, deve
                  permanecer de fora.
                  
                  
                  PD
                  - Você gosta de um mote? Qual a sua epígrafe predileta?
                  
                  
                  DTV
                  - Nenhum em especial. Recebo cutucões e os transformo em
                  palavra. A minha epígrafe predileta é sempre a da minha próxima
                  leitura.
                  
                  
                  PD
                  - Qual uso faz da internet? O e-book substitui o livro?
                  
                  
                  DTV
                  - A internet me serve apenas como meio de comunicação. O
                  livro, no formato como o conhecemos desde Gutemberg, com páginas,
                  capa, lombada, com seu cheiro de tinta e manuseio, impressões
                  digitais, marcas do corpo que o manuseou, e também como
                  objeto de formação, conhecimento, sabedoria, é insubstituível.
                  O e-book é apenas uma novidade eletrônica, uma outra opção
                  de suporte. Uma forma, portanto, não exclui a outra.
                  
                  
                  PD
                  - A poesia serve para alguma coisa?
                  
                  
                  DTV
                  - Para nada, além de tornar o homem um pouco mais humano.
                  
                  
                  PD
                  - Quem é o escritor brasileiro? Ele deve ter alguma função
                  social e política? Deveria ter?
                  
                  
                  DTV
                  - O escritor brasileiro é o que todo escritor é,
                  independentemente do país de sua origem: se genial (e, como
                  sabemos, gênios são raros), ficará para o patrimônio da
                  humanidade; se bom (e há muitos e bons e criativos escritores
                  brasileiros) contribuirá para a formação do grande bolo da
                  literatura de seu país que, no seu conjunto, não é formada
                  apenas de gênios, mas de artífices tocados por algo indefinível,
                  meio mágico, que é o que diferencia o bom do medíocre. O
                  produto de um escritor, ou seja, a sua escritura, não deve
                  ter uma função social específica, mas o escritor, enquanto
                  homem, sim, pois é um ser social e, como tal, tem uma função
                  que é a de comprometimento com o seu meio sócio-político-cultural,
                  um papel que vai além do papel e do que nele está escrito, a
                  obrigação de agir como cidadão. Esse papel, acredito, não
                  admite alienação nem omissão.